terça-feira, 4 de junho de 2013

Neofilia

O hábito de excitações cada vez mais forte tende a fazer desaparecer progressivamente a capacidade de sentir prazer. Não é portanto surpreendente que homens blasés procurem excitações sempre novas. Esse amor pela novidade ou “neofilia” afeta praticamente todas as relações de que o homem é capaz com o mundo exterior. Para as pessoas contaminadas por essa doença cultural, um par de sapatos, uma roupa, um carro, perdem o encanto com pouco tempo de uso, exatamente como a pessoa amada, o amigo ou até mesmo a pátria. Posso parecer paradoxal ou cínico, ao afirmar que a pena que alguns de nós sentimos, ao jogar no lixo um velho cachimbo fiel ou um par de calças velhas, tem as mesmas origens que as ligações sociais tecidas entre amigos humanos. Mas quando lembro dos sentimentos com os quais acabei de vender o meu velho carro, ligado a tantas boas lembranças de viagens, devo dizer que eram semelhantes aos de adeus a um amigo. Essa reação surpreende quando ligada a um objeto inanimado, é não só válida como justificada a respeito de um animal evoluído, como um cão. Afastei-me interiormente de numerosas pessoas que me falavam do seu cão e depois acrescentavam: “Mas tivemos que dá-lo de presente quando fomos morar na cidade”.

Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, Uma Tepidez Mortal, Pg. 60.

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