segunda-feira, 3 de junho de 2013

Instant gratification

O desenvolvimento da tecnologia moderna e especialmente da farmacologia favorecem, em medida até então desconhecida, a aspiração humana de evitar o sofrimento. O conforto moderno é tão usual, que mal nos damos conta de quanto necessitamos. A mais modesta das empregadas ficaria revoltada se lhe oferecêssemos um quarto com aquecimento, a iluminação, a cama e o tipo de conforto que pareciam ótimas a Goethe ou à duquesa Amélia de Weimar. Há poucos anos, quando um incidente catastrófico cortou a eletricidade de Nova Iorque durante algumas horas, muitos pensaram seriamente que o fim do mundo tinha chegado. Mesmo aqueles que acreditavam nas vantagens dos bons tempos e, sobretudo no valor educativo de uma vida espartana, mudariam de opinião se fossem forçados a se submeter ao tratamento cirúrgico usado há dois mil anos. Dominando progressivamente seu meio, o homem moderno, por força das circunstâncias, deslocou o equilíbrio prazer-desagrado no sentido de uma hipersensibilidade crescente a respeito de toda situação dolorosa,
enquanto que sua capacidade de prazer foi se embotando. Por uma série de razões, semelhante situação acarreta conseqüências deletérias.


Uma intolerância crescente para com o desagrado, aliada à redução da atração pelo prazer, leva os homens a perder a capacidade de trabalhar arduamente em busca de um resultado distante embora promissor. Disso, resulta uma exigência impaciente de satisfação de todo desejo embrionário. A necessidade de satisfação imediata (Instant gratification) é infelizmente favorecida de todos os modos pelas empresas comerciais e pelos produtores, sendo espantoso constatar que os consumidores não se dão conta do quanto se tornaram escravos das compras a prazo. Por razões fáceis de entender, a necessidade incoercível de satisfação imediata acarreta conseqüências especialmente desastrosas no âmbito do comportamento sexual. A perda da capacidade de dispor-se a um objetivo a longo prazo causa o desaparecimento das etapas, sutilmente diferenciadas, do comportamento instintivo ou cultural para a conquista do objeto amado. Vemos o desaparecimento não só do programa genético concebido visando à reprodução, mas ainda das normas do comportamento cultural, que buscam o mesmo objetivo no âmbito de uma cultura.

O comportamento resultante, essa satisfação sexual imediata que vemos glorificada por tantos filmes modernos, é freqüente e erroneamente qualificada como satisfação animal. É raríssimo, nos animais superiores, esse tipo de comportamento. Seria melhor dizer “bestial”, se entendermos por bestas aquelas que o homem domesticou, fazendo com que esquecessem as etapas diferenciadas dos ritos e os comportamentos que precedem o acasalamento, a fim de facilitar sua criação.
Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, Uma Tepidez Mortal, Pg. 57.

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