sábado, 31 de março de 2012

Da resposta que deu D. Quixote ao seu repreensor

 
Erguido, pois, D. Quixote, tremendo desde os pés até à cabeça, com azougada, pressurosa e turva língua, disse:

— O lugar onde estou, a presença de tão excelsas pessoas e o respeito que sempre tive e tenho ao estado que Vossa Mercê professa, atam-me as mãos ao justíssimo enfado; e assim, tanto pelo que disse, como por saberem todos que as armas dos que vestem sotainas são, como as das mulheres, a língua, entrarei, servindo-me da minha, em igual batalha com Vossa Mercê, de quem se deviam esperar antes bons conselhos do que infames vitupérios. As repreensões santas e bem intencionadas requerem outras circunstâncias e pedem outros assuntos; pelo menos, o repreender-me em público e tão asperamente, excedeu todos os limites da censura cordata; porque às primeiras cabe melhor a brandura do que a aspereza; não me parece bem que, sem ter conhecimento do pecado que se repreende, se chame ao pecador, sem mais nem mais, mentecapto e tonto. Senão, diga-me Vossa Mercê: que tonteria viu em mim, para me condenar e vituperar, e mandar-me que vá para minha casa tomar conta do seu governo, e de minha mulher e de meus filhos, sem saber se tenho filhos e mulher? Então não é mais senão entrar a trouxe-mouxe pelas casas alheias a governar os donos delas, e, tendo-se criado alguns dos que isso fazem na estreiteza dum seminário, sem terem visto mais mundo do que o que pode encerrar-se em vinte ou trinta léguas de comarca, meterem-se de rondão a dar leis à cavalaria e a julgar os cavaleiros andantes? Porventura é assunto vão, ou é tempo desperdiçado o que se gasta em vaguear pelo mundo, não procurando os seus regalos, mas sim as asperezas por onde ascendem os bons à sede da imortalidade? Se me tivessem por tonto os cavaleiros, os magníficos, os generosos, os de alto nascimento, considerá-lo-ia eu afronta irreparável; mas que me tenham por sandeu os estudantes, que nunca pisaram a senda da cavalaria, pouco me importa; cavaleiro sou e cavaleiro hei-de morrer, se aprouver ao Altíssimo: uns seguem o largo campo da ambição soberba, outros o da adulação servil e baixa, outros o da hipocrisia enganosa, e alguns o da verdadeira religião; mas eu, guiado pela minha estrela, sigo a apertada vereda da cavalaria andante, por cujo exercício desprezo a fazenda, mas não a honra. Tenho satisfeito agravos, castigado insolências, vencido gigantes e atropelado vampiros: sou enamorado, só porque é forçoso que o sejam os cavaleiros andantes, e, sendo-o, não pertenço ao número dos viciosos, mas sim ao dos platônicos e continentes. As minhas intenções sempre as dirijo para bons fins, que são fazer bem a todos e mal a ninguém. Se quem isto entende, se quem isto pratica, se quem disto trata, merece ser chamado bobo, digam-no vossas grandezas, duque e duquesa excelentes.
 
CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de; O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha, Tomo II, Capítulo XXXII.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Arjuna



In piedi sul grande carro da guerra
De pé em seu grande carro de guerra
Arjuna guardava a nord
Arjuna contemplava o norte
Parenti ed amici sul fronte nemico
Parentes e amigos no fronte inimigo
Si stagliano contro il sol
Delineiam-se contra o sol

L'angoscia dipinta sul volto smarrito
A angústia impressa em sua face absorta
Oppure la sua pietà
Contraria a sua piedade
Arjuna il suo arco depose
Arjuna depõe o seu arco
Ma non per viltà
Mas não por vileza

Della famiglia l'ordine sacro
Da família a ordem sagrada
No non si può sovvertir
Não se pode subverter
Più che colpire un fratello
Mais que golpear um irmão
In battaglia di certo è meglio morir
Em batalha, decerto é melhor morrer
 

Distinguer tra caste di genti diverse
Distinguir-se entre castas de pessoas diversas
E' avere rispetto di se
E possuir o respeito de si
La mescolanza e il delitto
A mistura é o delito
Più grande che c'è
Mais grave que há

Kaurava e pandava un'unica gente
Kaurava e Pandava um único clã
Dall'odio costretta a lottar
Pelo ódio é forçado a lutar
L'auriga del carro rivolto ad arjuna
O cocheiro do carro revolto de Arjuna
Lo invita ad ascoltar
Convida-o a escutar

Parole che son come pietre scagliate
Palavras que são como pedras lançadas
Che destano saggi ed eroi
Que despertam sábios e heróis
Risvegliano lo spirito ariano
Reacende o espírito Ariano
Che è dentro di noi
Que existe dentro de nós

Non ci saranno fratelli in battaglia
Não serão irmãos em batalha
Ma corpi che tu colpirai
Mas corpos que tu golpearás
La carne è caduta lo spirito eterno,
A carne é perecível, o espírito eterno,
Chi cade non morirà mai
Quem cai jamais morrerá

Nessuno uccide nessuno in battaglia
Ninguém mata ninguém em batalha
Ma offre il suo dono agli dei
Mas oferece sua doação aos Deuses
E' il dharma della stirpe di sangue
É o Dharma da estirpe do sangue
Degli indoeuropei
Dos indo-europeus

Lanciati quindi in battaglia arjuna
Lança-te assim em batalha Arjuna
E ignora piacere e dolor
E ignore o prazer e a dor
Vittoria e disfatta dimenticata e agisci
Vitória e derrota, esquece-as e age
Soltanto a difender l'onor
Somente a defender a honra

Affrancati dai desideri e dai frutti dell'atto
Liberta-te dos desejos e dos frutos do ato
Che rifiuterai
Que refutarás
Solo per il sacrificio
Apenas pelo sacrifício
Tu lotterai
Tu lutarás

Distacco e disinteresse
Desapego e desinteresse
Illumineranno le tue virtù
Iluminarão as tuas virtudes
Nel tendere forte quell'arco la rabbia
No tensionar forte daquele arco, a raiva
Segnata dalla tua gioventù
Marcada da sua juventude

La scimmia è l' insegna di quella bandiera
A símia é o símbolo daquela bandeira
Che al vento garrisce già
Que ao vento flamula já
E' il drappo che porti nel cuore
É o estandarte que portarás no coração
Per l'eternità
Pela eternidade


Vida imita arte


 

Homem cai de penhasco após tentar apanhar flor para namorada.


Tradução: RammsteinBR


Sah ein Mädchen ein Röslein stehen
Uma garota viu uma pequena rosa
Blühte dort in lichten Höhen
Ela floresceu lá no cume brilhante
Sprach sie ihren Liebsten an
Ela perguntou ao seu amor
ob er es ihr steigen kann
Se ele poderia trazê-la para ela

Sie will es und so ist es fein
Ela a quer e tudo bem
So war es und so wird es immer sein
Assim foi e assim sempre será
Sie will es und so ist es Brauch
Ela a quer e esse é o hábito
Was sie will bekommt sie auch
Tudo que ela quer ela consegue

Tiefe Brunnen muss man graben
Poços profundos precisam ser cavados
wenn man klares Wasser will
Se você quiser água limpa
Rosenrot oh Rosenrot
Rosa vermelha, oh Rosa vermelha
Tiefe Wasser sind nicht still
Águas profundas não são calmas

Der Jüngling steigt den Berg mit Qual
O menino sobe a montanha com sofrimento
Die Aussicht ist ihm sehr egal
Ele não liga para a vista
Hat das Röslein nur im Sinn
Apenas a pequena rosa está em sua mente
Bringt es seiner Liebsten hin
Ele a traz para seu amor

Sie will es und so ist es fein
Ela a quer e tudo bem
So war es und so wird es immer sein
Assim foi e assim sempre será
Sie will es und so ist es Brauch
Ela a quer e esse é o hábito
Was sie will bekommt sie auch
Tudo que ela quer ela consegue

Tiefe Brunnen muss man graben
Poços profundos precisam ser cavados
wenn man klares Wasser will
Se você quiser água limpa
Rosenrot oh Rosenrot
Rosa vermelha, oh Rosa vermelha
Tiefe Wasser sind nicht still

Águas profundas não são calmas

An seinen Stiefeln bricht ein Stein
Em suas botas, uma pedra quebra
Will nicht mehr am Felsen sein
Não quer mais estar no penhasco
Und ein Schrei tut jedem kund
E um grito deixa que todos saibam
Beide fallen in den Grund
Ambos estão caindo em direção ao chão

Sie will es und so ist es fein
Ela a quer e tudo bem
So war es und so wird es immer sein
Assim foi e assim sempre será
Sie will es und so ist es Brauch
Ela a quer e esse é o hábito
Was sie will bekommt sie auch
Tudo que ela quer ela consegue

Tiefe Brunnen muss man graben
Poços profundos precisam ser cavados
wenn man klares Wasser will
Se você quiser água limpa
Rosenrot oh Rosenrot
Rosa vermelha, oh Rosa vermelha
Tiefe Wasser sind nicht still

Águas profundas não são calmas

quinta-feira, 29 de março de 2012

Da vingança

— Eu, meus senhores, sou cavaleiro andante, cujo exercício é o das armas e cuja profissão é a de favorecer os que de favor precisam, e acudir aos que de socorro hão mister. Há dias que soube da vossa desgraça e da causa que vos move a pegar em armas, para vos vingardes dos vossos inimigos; e, tendo pensado maduramente no vosso negócio, entendo, segundo as leis do duelo, que andais erradamente, supondo-vos afrontados, porque nenhum particular pode afrontar um povo inteiro, senão arrojando a todos juntos o epíteto de traidores, por não saber qual deles foi que cometeu a traição. Temos exemplo disto em D. Diogo Ordoñez de Lara, que desafiou todo o povo de Samora, porque ignorava que só Velido Dolfos fora o traidor que matara o seu rei, e por isso a todos reptou e a todos tocava a vingança e a resposta; e, ainda assim, não pode deixar de se dizer que o senhor D. Diogo andou com certa precipitação, e passou muito adiante dos limites do repto, porque não tinha motivo para reptar os mortos, as águas e os pães e os que ainda não tinham nascido, nem as outras minudências que no desafio se declaram; mas, enfim, passe! porque, quando a cólera se apodera impetuosamente de um homem, não há quem lhe segure a língua, nem há freio que a corrija. Sendo, pois, isto assim, que um homem só não pode afrontar nem reino, nem província, nem cidade, nem república, nem povo algum inteiro, é claro que não há motivo para sairdes a vingar-vos de semelhante afronta, que o não é, porque seria curioso que a cada passo se matassem os habitantes de diferentes povoações, que têm diversas alcunhas, e os que lhas puseram ou que por elas os chamem; seria estranho, decerto, que todos os povos insignes, que têm alcunhas, se chacoteassem e se vingassem e andassem continuamente de espada desembainhada em qualquer pendência, por pequena que fosse. Não, não, nem Deus tal permita, nem queira; os varões prudentes, as repúblicas bem concertadas, por quatro coisas hão-de pegar em armas e arriscar as suas pessoas, vidas e fazendas. Primeira, para defender a fé católica; segunda, para defender a vida, que é de lei natural e divina; terceira, em defesa da sua honra, da sua família e da sua fazenda; quarta, em serviço do seu rei em guerra justa; e, se lhe quisermos ainda acrescentar uma quinta causa, para defender a sua pátria. A estes cinco motivos capitais se podem acrescentar alguns outros justos e razoáveis, que obriguem a tomar as armas; tomá-las, porém, por ninharias e por causas que são antes de riso e passatempo, que de afronta, não parece de gente razoável; tanto mais que o tirar vingança injusta (que justa não a pode haver), vai diretamente contra a santa lei que professamos, em que se nos manda que façamos bem aos nossos inimigos e amemos a quem nos aborrece; mandamento que, ainda que pareça um tanto dificultoso de cumprir, não o é senão para aqueles que têm menos de Deus que do mundo, e mais de carne que de espírito, porque Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, que nunca mentiu, nem pôde nem pode mentir, sendo nosso legislador, disse que o seu jugo era suave, e leve a sua carga; e assim, não nos podia ordenar coisas que fossem impossíveis de executar. Portanto, meus senhores, Vossas Mercês são obrigados, pelas leis divinas e humanas, a desistir da luta.

CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de; O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha, Tomo II, Capítulo XXVII.

quarta-feira, 28 de março de 2012

A mulher boa

 
— Olhai, discreto Basílio — acrescentou D. Quixote — foi opinião de não sei que sábio que só havia em todo o mundo uma mulher boa, e dava por conselho que todos pensassem e acreditassem que a sua era essa, e assim viveriam contentes. Eu não sou casado, e até agora não pensei em casar, e, contudo, atrever-me-ia a aconselhar, a quem o desejasse, o modo como havia de procurar esposa. Primeiro aconselhar-lhe-ia que olhasse mais à fama que à fazenda, porque a mulher boa não alcança boa fama só com o ser boa, mas também com parecê-lo, que muito mais prejudicam a honra das mulheres as desenvolturas e liberdades públicas, do que as maldades secretas. Se levas mulher já de si boa para tua casa, não será difícil conservá-la assim e até melhorá-la; mas se a levas má, meter-te-ás em trabalhos, querendo emendá-la, que não é muito fácil passar dum para outro extremo. Não digo que seja impossível, mas tenho-o por dificultoso.
 
CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de; O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha, Tomo II, Capítulo XXII.

terça-feira, 27 de março de 2012

A Sancho



Apenas a branca Aurora dera lugar a que o lúcido Febo, com o ardor dos seus quentes raios, enxugasse as líquidas pérolas dos seus cabelos de ouro, D. Quixote, sacudindo o torpor dos seus membros, pôs-se a pé e chamou o seu escudeiro Sancho, que ainda ressonava, e, antes de o despertar, exclamou:
 
— Ó tu, bem-aventurado mais do que todos os que vivem na face da terra, pois, sem teres inveja, nem seres invejado, dormes com tranqüilo espírito, sem te perseguirem nigromantes, nem sobressaltarem nigromancias. Dorme, repito, e repetirei cem vezes, sem te inspirarem continuada vigília zelos da tua dama, nem te desvelarem pensamentos de pagar dívidas, nem do que hás-de fazer para comer no dia seguinte, tu e a tua pequena e angustiada família, nem a ambição te inquieta, nem a vã pompa do mundo te fatiga, pois os limites dos teus desejos não se estendem além do teu jumento, que o da tua pessoa carrega nos meus ombros, contrapeso e carga que puseram a natureza e o costume aos amos. Dorme o criado, está o amo de vela, pensando como o há-de sustentar e melhorar, e fazer-lhe mercês. A angústia de ver que o céu se faz de bronze, sem acudir à terra com o conveniente orvalho, não aflige o criado, aflige o amo, que há-de sustentar na esterilidade e na fome o que o serviu na fertilidade e na fartura.

CERVANTES SAAVEDRA, Miguel de; O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de La Mancha, Tomo II, Capítulo XX.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Vinho de Janeiro



Hörst Du die Glocken läuten?
Ouves o repique dos sinos?
Ich höre sie nicht mehr.
Eu não os ouço mais.
Siehst Du die Felder leuchten?
Vês o luzir das campinas?
Ich sehe sie nicht mehr.
Eu não o vejo mais.

Ein fahler Wind, der mich umhüllt,
Uma languida brisa, me envolve,
er treibt mich fort von hier,
Ela me leva para longe daqui,
aus diesem engen Tale,
Desses austeros vales,
es hält mich nichts mehr hier.
Não quedo-me mais aqui.

Über Straßen, Staub und Felder,
Sobre estradas, poeira e campos,
zieht der Weg sich lange hin,
Alonga-se o caminho até ela,
der Berg voraus,
A montaha a frente,
zum Tal hinaus,
Elevando-se do vale,
vorwärts - heimwärts drängt der Sinn
Avante, para casa, nos incitam nossos espíritos.

|: Die Sonne steigt, wir steigen mit,
O sol ascende, nós ascendemos juntos,
Den Berg empor mit festem Schritt,
À montanha altaneira, com passo firme,
Wir können nicht mehr wenden.
Nós não podemos mais retornar.
Ein letzter Blick, kein Weg zurück;
Um último olhar, sem volta atrás.
Für jeden Pfad den man betritt,
Pois a cada nova senda que iniciamos
Muß ein alter enden. :|
Uma antiga deve terminar.

Aus den Wäldern steigt der Nebel,
Das florestas sobe a neblina,
des Tales Glocken, sie sind stumm,
Dos vales os silentes sinos,
Schweigen umgibt mich wie ein Segen,
A quietude que envolve-me como uma benção,
ein letztes Mal dreh ich mich um.
Uma última vez me volto para trás.

|: Die Sonne steigt... :|

Jännerwein 

sexta-feira, 23 de março de 2012

O dia mais negro




Was auch immer ihr tut
O que quer que vocês façam
Wo auch immer ihr seid
Onde quer que vocês estejam
Ich hab euch bei mir
Eu os tenho ao meu lado
Und ich lass euch Frei
E os deixo livres

Das Licht in den Händen
A luz nas mãos
Und alles ist hell
E tudo é claro
Denn jeder von euch bleibt
Porque cada um de vocês
Ein Stück meiner Welt
É um pedaço do meu mundo

Das ist die dunkelste Stunde
Esta é a hora mais escura
Der dunkelste Tag
O dia mais negro
Von hier an wirds hell
Daqui tudo se iluminará
Bis ans Ende der Nacht
Até o fim da noite
Das ist die dunkelste Stunde
Esta é a hora mais escura
Der schwerste Tag
O dia mais pesado

Die Erde dreht ihre Kreise
A terra continua a girar
Jeder geht seinen Weg
Cada um segue seu caminho
Egal wo ihr seid
Onde vocês estiverem
Ich kann euch sehen
Eu os posso ver

Am Ende des Tunnels
No final dos tuneis
Wird es irgendwann hell
Acha-se eventualmente a luz
Geht jetzt da raus
Venham para fora
Und verändert diese Welt
E modifiquem esse mundo

Das ist die dunkelste Stunde
Esta é a hora mais escura
Der dunkelste Tag
O dia mais negro
Von hier an wirds hell
Daqui tudo se iluminará
Bis ans Ende der Nacht
Até o fim da noite
Das ist die dunkelste Stunde
Esta é a hora mais escura
Der schwerste Tag
O dia mais pesado

quarta-feira, 21 de março de 2012

Das Schicksal



Houve mora na tradução deste poema, pelas seguintes causas:

1. Dos termos arcaicos, em desuso ou com ortografia diferente do alemão atual, 

2. Do caráter poético no processo de convergência ao português.

Pelo que pesquisei na internet, não há nenhuma tradução deste poema tanto para o inglês quanto para o português, portanto essa é a primeira vez que esse poema é traduzido para o português, pelo menos no ambito digital. Excertos desse poema são usados na canção de mesmo nome da banda Bielorussa Svalbard, realcei de vermelho as partes que são usadas na música, no video acima a canção começa no minuto 3:00. "Das Schicksal" significa "O destino".


Das Schicksal.

Προσκυνουντες την ειμαρμενην, σοφοι.
Aeschylus.


Als von des Friedens heil’gen Thalen,
Como se da concórdia os sacros vales,
Wo sich die Liebe Kränze wand,
Onde o amor coroara-se em suas muralhas,
Hinüber zu den Göttermahlen
Pelo qual o néctar dos Deuses,
Des goldnen Alters Zauber schwand,
Nos encantos de antanho esvanescem,
Als nun des Schicksals eh’rne Rechte,
Apenas do destino o granítico direito,
Die große Meisterin, die Noth,
A grandiosa mestra, a angústia,
Dem übermächtigen Geschlechte
Que a toda criatura vivente impinge
Den langen, bittern Kampf gebot:
A mais longa e renhida peleja:


Da sprang er aus der Mutter Wiege,
Ali ele saltou do berço materno,
Da fand er sie, die schöne Spur.
Ali ele os encontrou, os belos traços.
Zu seiner Tugend schwerem Siege,
Das suas virtudes a difícil vitória,
Der Sohn der heiligen Natur;
O filho da sacra natureza;
Der hohen Geister höchste Gabe,
Dos altos espíritos o mais insigne condão,
Der Tugend Löwenkraft begann
A virtude da força leonina nascida
Im Siege, den ein Götterknabe
Em vitória,  essa criança dos Deuses
Den Ungeheuern abgewann.
Das potestades hauriu.


Es kann die Lust der goldnen Ernte
Como o deleite benfazejo das colheitas douradas
Im Sonnenbrande nur gedeih’n;
Que apenas florescem sob os cálidos raios de sol;
Und nur in seinem Blute lernte
Também apenas em seu sangue aprendera,
Der Kämpfer, frei und stolz zu seyn;
O lutador a ser orgulhoso e livre;
Triumph! Die Paradiese schwanden,
Triunfo! O paraíso deslinda-se,
Wie Flammen aus der Wolke Schoos,
Como a flama do seio das nuvens,
Wie Sonnen aus dem Chaos, wanden
Como a luz, das trevas, ergue-se o herói
Aus Stürmen sich Heroen loß.
Das negras borrascas vindouras.


Der Noth ist jede Lust entsprossen,
A agonia é o desejo que emana,
Und unter Schmerzen nur gedeiht
E temperado sob a dor prospera,
Das Liebste, was mein Herz genossen,
O mais dileto, em que meu coração regozijou,
Der holde Reiz der Menschlichkeit;
O doce encanto da humanidade;
So stieg in tiefer Fluth erzogen,
Então avança contra as mais altas marés,
Wohin kein sterblich Auge sah,
Onde jamais olhos mortais contemplaram,
Stillächelnd aus den schwarzen Wogen
Num sorriso plácido, das negras vibrações
In stolzer Blüte Cypria.
Mais orgulhosa floresce Afrodite.


Durch Noth vereiniget, beschwuren
Entre as angústias conjuradas, evocadas
Vom Jugendtraume süß berauscht,
Dos doces sonhos de uma juventude ébria.
Den Todesbund die Dioskuren,
Dos píncaros da morte, os Dióscuros,
Und Schwerd und Lanze ward getauscht;
E permutaram espadas e lanças.
In ihres Herzens Jubel eilten
Em seus corações um frêmito de alegria
Sie, wie ein Adlerpaar, zum Streit,
Eles, como um par de águias, à batalha.
Wie Löwen ihre Beute, theilten
Como os leões as suas presas, dividem
Die Liebenden Unsterblichkeit. —
Os enamorados a imortalidade.


Die Klagen lehrt die Noth verachten,
Os clamores ensinaram a desprezar as angustias,
Beschämt und ruhmlos läßt sie nicht
A ignomínia e o opróbrio não os tolhiam.
Die Kraft der Jünglinge verschmachten.
As forças da juventude evanescente.
Giebt Muth der Brust, dem Geiste Licht;
O peito outorgara coragem, a alma, luz;
Der Greise Faust verjüngt sie wieder;
O punho vestuto neles rejuvenece;
Sie kommt, wie Gottes Blitz, heran,
Eles vieram, num lampejo divino, avante,
Und trümmert Felsenberge nieder,
E demoliram montanhas,
Und wallt auf Riesen ihre Bahn.
E percorreram assim sua colossal senda.


Mit ihrem heil’gen Wetterschlage,
Com suas sacras borrascas,
Mit Unerbittlichkeit vollbringt
Com suas gestas inexoráveis,
Die Noth an Einem großen Tage,
A dor de um dia supremo,
Was kaum Jahrhunderten gelingt;
Com trabalhos em um século venceram
Und wenn in ihren Ungewittern
E quando em suas intempestividades
Selbst ein Elysium vergeht,
Por si mesmos subiram aos Elísios
Und Welten ihrem Donner zittern —
E mundos que seus trovões estremeceram
Was groß und göttlich ist, besteht. —
De grandeza e divindade constituidos.


O du, Gespielin der Kolossen,
Oh tu, amiga dos colossos,
O weise, zürnende Natur,
Oh sábia, furiosa Natureza,
Was je ein Riesenherz beschlossen,
Que decidira, um valoroso coração,
Es keimt’ in deiner Schule nur;
Germinar em teus discipulos apenas;
Wohl ist Arkadien entflohen.
Naqueles que de Arcádia fugiram.
Des Lebens bessre Frucht gedeiht
Os mais vicejantes frutos da vida floresceram
Durch sie, die Mutter der Heroen,
Através dela, a mãe dos Heróis,
Die eherne Nothwendigkeit. —
A bélica inquietude.


Für meines Lebens goldnen Morgen
Pelas áureas manhãs de minha vida,   
Sei Dank, o Pepromene, dir!
Graças sejam dadas a vós, ó Pepromene!
Ein Saitenspiel und süße Sorgen
Notas maviosas e doce inquietude
Und Träum’ und Thränen gabst du mir;
E sonhos e lágrimas tu me deste;
Die Flammen und die Stürme schonten
As flamas e os ímpetos bravios aquartelam
Mein jugendlich Elysium,
Meu juvenil Elísio,
Und Ruh’ und stille Liebe thronten
E a paz e o sereno amor soberanos
In meines Herzens Heiligthum.
Na santidade do meu coração.


Es reife von des Mittags Flamme,
Temperado nas chamas do meio-dia,
Es reife nun vom Kampf und Schmerz
Provado pela dor e pela batalha
Die Blüth’ am gränzenlosen Stamme,
O florescer de uma valorosa estirpe,
Wie Sprosse Gottes, dieses Herz!
Como a semente divina, nesse coração!
Beflügelt von dem Sturm, erschwinge
Insuflado pela tempestade, eleva-se
Mein Geist des Lebens höchste Lust,
Minha alma às mais altas aspirações da vida,
Der Tugend Siegeslust verjünge
O virtuoso fervor rejuvenescido
Bei kargem Glücke mir die Brust!
Pelo austero porvir em meu peito!


Im heiligsten der Stürme falle
Na pureza da tempestade destruidora
Zusammen meine Kerkerwand,
Esboroam-se também as muralhas da minha prisão
Und herrlicher und freyer walle,
E soberana e altiva,
Mein Geist in’s unbekannte Land!
Minha alma voga pelas paragens desconhecidas!
Hier blutet oft der Adler Schwinge;
Amiude aqui sangraram as asas do falcão;
Auch drüben warte Kampf und Schmerz!
E além, onde residem a luta e dor!
Bis an der Sonnen lezte ringe,
Até os ulteriores círculos solares,
Genährt vom Siege, dieses Herz.
Alimentado pela vitória, esse coração.


Hölderlin.