quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Verão



Wie ein Licht bricht in die Nebel 
Como a luz que brilha na névoa
Wenn ein neuer Tag erwacht
Quando um novo dia começa
Und ich öffne meine Augen
Eu abro meus olhos
Vor des Sommers goldner Pracht
Diante do áureo esplendor do verão

Was da lag in mir gefroren
O que havia em mim congelado
Unter blauen Himmeln taut 
Sob o azul do céu derrete
Was ich gab schon als verloren 
O que eu tinha dado como perdido
Gibt nun preis das junge Laub
Renova-se agora no verdor das folhas

Und der Wind, er singt von Morgen 
E o vento canta pela manhã
Ein Versprechen in der Luft
Uma promessa no ar
Ich denke an ein Lächeln
Eu penso em um sorriso
An ihrer Haare süßen Duft
No doce perfume de seus cabelos

Du bist der Glanz eines Wassers hell und klar
Você é o fulgor de uma água clara e pura
Du bist ein Traum und Du bist wahr
Você é um sonho e você é verdade
Du bist ein Zauber und still erlieg ich Deiner Macht
Você é um encanto e silente eu sucumbo ao teu poder
Du bist der Morgen einer sternenklaren Nacht
Você é a manhã de uma refulgente noite estrelada

A terra dos falsos gigantes

Que doce e ilusória vanidade pervade nossa sociedade, tudo deve ser visto, tudo deve ser exposto, o mistério do ignoto desvaneceu-se. Tudo em prol do ego, pela admiração, a massa se acotovela pela atenção uns dos outros, são inclusive, mercadoria de entretenimento expostos nas vitrines virtuais, e nem sequer ganham para isso.

Como se cada vida fosse única, assim eles pensam e assim amam excessivamente suas próprias vidas, e cultuam-se não obstante nunca tenham elevado-se da mediocridade inata.

Quem diria... Finalmente reconheço, a humildade é uma virtude escassa, nesse mar monstruoso de egos e de pessoas "únicas"...

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Geheimnis



Ich hege im Geheimen
Eu aprecio em segredo
Ein fest verschloßnes Glas
Uma garrafa firmemente selada
Wenn auch der Trost in Reimen
Quando mesmo ao conforto das rimas
Den Weg zu mir vergaß
O caminho por mim for esquecido

Ich hab, wenn ich allein war,
Por vezes quando eu ficava só
Das Glas so oft entblößt,
Essa garrafa frequentemente eu abri
Den kleinen Gott, der scheinbar
A pequena deusa, a ilusão,
Die ganze Welt erlöst.
Redimiu o mundo inteiro

Und weiß: Du bleibst für immer
E sei: você está para sempre
In leichter Abendluft,
Em crepúsculos agradáveis,
Und schwer betäubt im Zimmer
E entorpecida n'uma alcova
Der Bittermandelduft.
Em perfume de armellinas.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Viver perigosamente

Mais de uma vez perguntei-me se era simples acaso o fato de Hitler e Mussolini tantos pontos em comum e tantos rasgos semelhantes em seus destinos. Ambos interessavam-se pela arquitetura, ambos apreciavam o filósofo Nietzsche e ambos suportavam o trágico destino da solidão humana. Nenhum dos dois teve um verdadeiro amigo; estavam rodeados de muitos lacaios e de muito poucos homens. Recordava duas citações de Nietzsche, que tinha ouvido de Hitler e de Mussolini. Teriam escolhido, por acaso, como lemas para suas vidas?

Acaso tento fazer minha felicidade?
Não; tento fazer minha obra.

E as breves mas significativas palavras:

Viver perigosamente.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 34, Pg. 317, Tomo II, Editora Bibliex.

Visão nietzscheana

Durante aqueles dias, nós, soldados alemães, chegamos a compreender muitas coisas. Tinha passado a época dos estados nacionais do rígido nacionalismo. Agora deveríamos procurar objetivos mais elevados. Todos nós, antigos inimigos e amigos de sempre, precisávamos encontrar uma solução "européia". Não devíamos renunciar a nossos ideais e sim projetá-los num plano mais nobre. A idéia "européia" devia emergir espontaneamente do caos reinante. Era evidente que esta idéia estava mais arraigada naqueles que estiveram animados de um apaixonado amor à pátria, no tempo em que procuravam a unidade da Europa e deram provas de que estavam dispostos a sacrificar-se por ela: os voluntários que lutaram nas fileiras das Waffen-SS.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 30, Pg. 256, Tomo II, Editora Bibliex.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A derrota

A 30 de abril fiquei sabendo pelo rádio a notícia da morte de Adolf Hitler; tinha morrido em Berlim, a capital do Reich que estava cercada pelos russos. Reuni os oficiais do meu estado-maior e lhes dei conhecimento da notícia. Receberam-na em silêncio, como se esperassem algo mais de mim. O que devia dizer-lhes? Meu breve discurso terminou com estas palavras:

- O Führer morreu. Viva a Alemanha!

No princípio, a morte de Adolf Hitler parecia um fato incrível. Mas tão logo a reflexão serenou meus pensamentos, cheguei à conclusão de que o Führer da Grande Alemanha devia morrer na sua Capital. Não podia ser testemunha de sua inevitável derrota. Os acontecimentos daquela época são muito recentes para que a personalidade de Hitler possa ser julgada. Essa tarefa é reservada aos historiadores dos próximos decênios. Para muitos alemães, honestos e de boa-fé, com Adolf Hitler perderam-se todas as esperanças de um futuro feliz.


Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 29, Pg. 253, Tomo II, Editora Bibliex.

domingo, 25 de agosto de 2013

Desertores

A opinião pública mundial deveria saber que todos os homens que naquele momento se encontravam na linha de frente permaneceram fiéis à Alemanha até o último instante. Os desertores não deviam ser procurados na frente e sim na retaguarda. Os sabotadores, na Alemanha, não se encontravam entre os trabalhadores, mas nos postos mais elevados. Pois como se explica o fato de, no outono de 1944, os trabalhadores do Ruhr terem tratado de impedir, a bastonadas, a fuga de unidades desmoralizadas da retaguarda da frente ocidental? Como se explica, nos meses posteriores, os mineiros das regiões próximas aos campos de batalha terem baixado às minas, a fim de extrair carvão para a defesa da pátria? Constatei pessoalmente que, quando os russos já estavam junto ao Oder, uma fábrica de Litzmannstadt chamou Berlim para saber se podia continuar o trabalho. Como se explica que as fábricas da Silésia continuassem trabalhando mesmo depois de estarem ao alcance do fogo da artilharia russa? Os trabalhadores permaneciam nas fábricas inclusive quando as posições avançadas eram abandonadas. Estavam convencidos de que os soldados alemães retornariam.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 29, Pg. 243, Tomo II, Editora Bibliex.

Bolcheviques

...Subitamente vimos um homem espreitando-nos através de uma janela; logo depois saiu à rua demonstrando ar de receio; não ousava crer no que estava vendo: soldados alemães! Muito excitado, contou-nos que os russos estavam na cidade há dois dias. Tinham instalado seu quartel-general junto à estação, em cujas imediações estavam estacionados vários tanques. Os russos utilizavam a ferrovia e frequentemente chegavam trens carregados de material e de pessoal.

Decidimos comprovar pessoalmente aqueles informes. Três homens aproximar-se-iam prudentemente da estação, fazendo uma volta pela cidade; outro grupo avançaria pela rua que conduzia diretamente à estação; o restante do pessoal ficaria junto à porta com as duas viaturas para cobri-los.

A espera deste reconhecimento pareceu-me uma eternidade. Lancei um olhar à minha volta e descobri horrorizado, no meio da rua, o cadáver quase desnudo e terrivelmente mutilado de uma mulher. Alguns habitantes da cidade ousaram sair de suas casas e a se aproximar de nós; a maioria dessas pessoas era constituída de mulheres e crianças, embora houvesse entre elas alguns homens de idade avançada. Pediram que os levássemos conosco. Não podíamos infelizmente atender aos seus pedidos, porque dispúnhamos de apenas duas viaturas. Sugeri, entretanto, que percorressem a pé  os poucos quilômetros até Königsberg; manteríamos a estrada livre durante meia-hora. Mas aqueles homens estavam tão desconcertados, que não chegaram a entender minha sugestão. Era evidente terem vivido dias terríveis; a maioria deles acabou por voltar às suas casas.

Finalmente regressaram os grupos de reconhecimento. Contatou-se que junto a estação havia aproximadamente trinta tanques. As tropas russas estavam acampadas, provavelmente, ao sul e a leste da cidade. tinham visto ainda vários cadáveres de paisanos nas ruas e calçadas; porém, não encontraram um só transeunte.

...

Duas mulheres muito jovens, carregando em seus braços os filhos lactentes, suplicavam-nos com lágrimas nos olhos para que as tirássemos dali. Deixamos que sentassem no assoalho de nossa viatura blindada e nos pusemos em marcha. Enquanto avançávamos em direção a Königsberg, sentíamos a consciência pesada. Mas o que podíamos fazer para ajudar aos habitantes da cidade ocupada? Quando passamos junto ao cadáver de nosso camarada morto naquela manhã, recolhemos seu corpo, colocando-o em nosso jipe: teria ao menos um enterro digno de um soldado. Quando ouvimos à nossa retaguarda o rugitar dos motores dos tanques soviéticos, já estávamos a salvo no interior dos bosque.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 28, Pg. 225, Tomo II, Editora Bibliex.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Dr. Morell

...Durante esta entrevista, que durou aproximadamente meia hora, tive oportunidade de observar Hitler detidamente. Aquele homem devia possuir um enorme domínio sobre si próprio, já que não notei nele qualquer sinal de depressão pelo fracasso da ofensiva das Ardenas, na qual foram depositadas tantas esperanças.

"Vamos lançar uma ofensiva de grande vulto no sudeste" -- disse ele quando nos despedimos.

Seu pensamento estava novamente na frente Leste. Confesso que não compreendi sua atitude. "Enganava a si próprio, ou estava sob a influência das injeções do professor Morell?" Este médico soube conquistar a confiança de Adolf Hitler. Outros médicos, tais como o Dr. Rudolf Brandt e o Dr. Hasselbach, estavam preocupados há muito tempo com o estado de saúde do Führer. O Dr. Brandt me contou que Morell tratava Hitler com medicamentos estimulantes, que a longo prazo deveriam ter um efeito nocivo. Por acaso o Dr. Brandt descobriu que Adolf Hitler tomava há algum tempo grandes quantidades de um preparado contra doenças gástricas. Brandt mandou analisar aquelas pílulas, aparentemente inócuas, e constatou que continham certa quantidade de arsênico. Por menor que fosse a quantidade ingerida, com o tempo, seus efeitos sobre o organismo de Hitler seriam desastrosos. Brandt deu o alarme, mas Morell saiu vencedor.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 27, Pg. 204, Tomo II, Editora Bibliex.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Malmedy


A 28 de dezembro de 1944 fomos substituídos por uma Divisão de Infantaria que se encarregou de proteger os flancos do I Corpo de Exército Blindado SS. O temido ataque inimigo não fora desencadeado. Talvez tenhamos conseguido iludir o inimigo sobre o verdadeiro valor das nossas forças. A Brigada foi transferida para um campo de repouso em Schlierbach, a leste de St. Vith., e não demorou para que fosse dissolvida.

Naqueles dias chegou-nos uma ordem circular muito curiosa: devia ser investigado imediatamente, em todas as unidades, um suposto fuzilamento de prisioneiros de guerra americanos. O resultado de tais investigações devia ser informado dentro de um determinado prazo. A ordem baseava-se numa notícia divulgada pela emissora de propaganda de Calais, afirmando que a 17 de dezembro vários soldados americanos tinham sido fuzilados próximo ao cruzamento de estradas existentes a sudeste de Malmedy. A 150.ª Brigada informou negativamente, sem se preocupar demasiadamente com a notícia, pois conhecíamos muito bem os métodos da propaganda inimiga. Considerávamos impossível que tropas alemãs cometessem um ato de tal natureza. Um oficial alemão jamais permitiria semelhante barbaridade e um soldado alemão, nem em sonho, pensaria num crime tão hediondo.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 26, Pg. 200, Tomo II, Editora Bibliex.

12 de junho de 1945 já prisioneiro de guerra.

Cheguei a conhecer o Coronel R. também sob outro aspecto. Como já disse, não éramos bons amigos. Em meados de julho veio visitar-me novamente. Entregou-me um documento, no qual constavam três perguntas, as quais devia responder 'sim' ou 'não'. Eu sabia perfeitamente a espécie de respostas que o Coronel esperava de mim, mas infelizmente não podia dá-las porque não correspondiam à verdade. O Coronel R. concedeu-me o prazo de uma hora para pensar, dizendo, como quem não quer nada, que na Inglaterra utilizavam-se métodos muito "diferentes" para interrogar prisioneiros e não lhe era difícil obter uma passagem de avião para as Ilhas Britânicas. Respondi ao documento de acordo com os ditames da minha consciência. Posteriormente fiquei sabendo de camaradas que, em circunstâncias semelhantes, fraquejaram diante de sua vontade. Não posso recriminá-los, pois sei por experiência própria o que significa encontrar-se submetido a uma pressão de tal natureza. No fim de uma hora vieram buscar o documento.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 31, Pg. 279, Tomo II, Editora Bibliex.

2 de agosto outro interrogatório.

No dia seguinte interrogou-me o Tenente-Coronel Burton Ellis. O tema foi a Battle of Bulge. A principal pergunta girou em torno de uma suposta ordem dada pelo VI Exército Blindado SS, para que fuzilassem os prisioneiros americanos.

Insisti dizendo jamais ter visto tal ordem e nem podia crer na sua existência. Negava-me a admitir a possibilidade de uma unidade do Exército Alemão ter levado a cabo aqueles fuzilamentos. A ser verdadeiro, o fato teria transpirado. Respondi ainda que, em fins de 1944, o VI Exército Blindado divulgou uma circular a todas as unidades para que informassem a respeito de tão bárbara notícia divulgada por uma emissora inimiga de Calais. O interrogatório prolongou-se pelo espaço de quatro horas e foi o mais duro que suportei até então.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 31, Pg. 282, Tomo II, Editora Bibliex.

A 21 de novembro transferiram-me para a chamada sala das testemunhas. Foi um alívio poder conviver novamente com seres humanos, com os quais era possível criar uma válvula de escape para os próprios pensamentos. A única coisa lamentável era o fato de, entre os sessenta ou setenta "inquilinos" da sala das testemunhas, haverem tão poucos "homens" que pudessem servir de exemplo aos mais jovens. Nós, que tínhamos lutado nas frentes de combate, sabíamos que muitos dos nossos dirigentes já não eram mais semideuses, e em muitos casos nem sequer mereciam o nome de dirigentes. Eram seres humanos com todos os defeitos e fraquezas inerentes à condição humana. Contudo, acreditávamos que após a derrota saberiam manter-se numa atitude digna. Mas, infelizmente, não foi assim. Em Nuremberg tive oportunidade de presenciar o lamentável espetáculo que muitos antigos dirigentes do Terceiro Reich ofereciam com sua covardia e pusilanimidade. 

Embora não deseje falar mal de ninguém neste livro, não posso deixar de citar um exemplo gritante de covardia como o foi o do ex-dirigente do jornal NSDAP, Amann, que afirmava peremptoriamente ter sido obrigado por Adolf Hitler a construir uma mansão luxuosa no valor de um milhão e meio de marcos, apesar de não ser um homem amante do luxo. E se isso não fosse suficiente, dedicava-se a difundir toda espécie de comentários sobre a vida íntima de Hitler. Certa ocasião, fui testemunha de uma delicada admoestação que lhe fez o Padre Sixto, dizendo que nem como sacerdote nem como homem estava interessado em tais "estórias".
 
...

O desejo de alguns acusados de salvar a pele, o medo pelo futuro e as possíveis acusações posteriores contra as testemunhas daquele processo determinaram os exageros produzidos por parte daquelas pessoas. Da mesma forma que tinham exagerado seu servilismo ao Terceiro Reich, agora exageravam suas declarações pretendendo ter travado uma "luta de resistência", afirmando seu "antagonismo íntimo" de sempre, falando de uma "sabotagem dos comandos" contra o regime. Mas, apesar de se reconhecer que grande parte daquelas declarações devia-se à pressão do novo estado de coisas, não se pode negar o fato de que eram fomentadas pelos vencedores. Neste sentido, os trabalhos da da Divisão Histórica norte-americana em Neustadt são uma fonte inesgotável de dados.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 31, Pg. 288, Tomo II, Editora Bibliex.

Naquela época realizava-se o famoso processo de Malmedy. A acusação esforçava-se há várias semanas em arrolar-me como testemunha, utilizando ameaças e promessas. Resisti a todas as pressões. Mas se a acusação desejava apresentar Skorzeny como testemunha daquele surpreendente processo, minha atuação seria muito diferente da que a acusação esperava. Declarei-me disposto a comparecer, desde que estivessem presentes os serviços de rádio, televisão e imprensa internacionais. Propunha-me a armar um escândalo na sala de audiências, revelando à opinião pública os nefandos métodos utilizados nos chamados "processos de criminosos de guerra". Três vezes levaram-me do hospital até a porta da sala e as três vezes me devolveram ao leito de enfermo. Pelo visto, tinham decidido prescindir da minha "colaboração".

Quando a sentença foi tornada pública, parecia-me impossível que pudesse ter ocorrido tal monstruosidade. De lábios de camaradas alemães tinha ouvido falar muito sobre o tratamento dispensado aos prisioneiros e sobre os métodos utilizados para obter as "confissões". Não era possível que o tribunal desconhecesse estas circunstâncias. Contudo, uma revisão posterior do processo devia trazer à luz toda a verdade. 

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 31, Pg. 292, Tomo II, Editora Bibliex.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

A vaca

No transcorrer do dia os artilheiros americanos tornaram-se cada vez mais impertinentes. Primeiro destruíram a canhonaços um local muito concorrido, cuja porta possuía um buraco em forma de coração. Depois foi a vez do estábulo, onde havia uma velha vaca que foi ferida numa pata traseira. Isso, entretanto, foi uma circunstância feliz, pois até então não tivéramos coragem de matar o animal e naquele momento apareceu a oportunidade para faze-lo sem que ficássemos com a consciência pesada. Colocamos na porta do estábulo o correspondente vale de requisição para que o proprietário da casa e dono da vaca, que tinha fugido, recebesse a indenização correspondente. É curiosa a sensação que se tem quando dispomos de um olho só. A direção e a distância não podem ser precisadas com a mesma exatidão de quando se dispõe da visão normal. Além disso, um verdadeiro entorpecimento parece apoderar-se de nosso organismo. Por este motivo não saía muito de "casa". A fim de ganhar tempo, preparamos os dados de tiro para o grupo de artilharia que nos prometeram. Nossos grupos de reconhecimento tinham localizado as posições de várias baterias americanas e por isso ficamos contentes, pois logo poderíamos replicar convenientemente sua enfadonha insistência.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 26, Pg. 196, Tomo II, Editora Bibliex.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Propaganda

Naquele primeiro contato com soldados americanos procurei averiguar se todos os combatentes de ultramar sabiam o que estava sendo forjado na Europa. Sabiam que a verdadeira solução da guerra, decisiva para o futuro, encontrava-se no leste? Sabiam quais as consequências que a derrota da Alemanha traria para a Europa? Comprovei, infelizmente, que tudo isto não significava nada para o jovem oficial. A propaganda americana apresentava os fatos de um modo muito simplista: "os alemães são os eternos bárbaros e, além disso, estão dominados por um demônio em forma de gente que deseja dominar o mundo inteiro, e seu povo o ajuda para isso. Por este motivo é um ato cristão, uma exigência da civilização, aniquilar a Alemanha e evitar para o resto da vida a sua recuperação". Esta era, em síntese, a opinião que o tenente me deu a conhecer com toda a franqueza.

Otto Skorzeny, Memórias, Capítulo 25, Pg. 174, Tomo II, Editora Bibliex.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

74 Canhões



Preso fue ayer mi navio
en las manos de Inglaterra
allá en los mares perdidos
sin rumbo a puerto ni tierra
Brigadier entre marinos
al frente de aquella armada
aquel triste Trafalgar
fue mi ultima morada

Pero no me arrodille
frente a esa bandera,
74 cañones fueron mi única respuesta

Ni perdon ni rendicion
escucharon de mi aliento
mi alma navegara en aquel Nepomuceno.
Dueño fui de tierra y mar
del viento y de la tormenta
y no pense en claudicar
frente a la armada extranjera

Pero no me arrodille
frente a esa bandera,
74 cañones fueron mi única respuesta
 

Mi leltad yo juré
a esa bandera sagrada
rojo y gualda los colores
que en el mastil ondeaban,
ahora en tiempo del ingles
perdurara con traicion,
pues yo jamas proclame
pleitesia o rendicion

Y jamas me arrodille
frente a esa bandera,
74 cañones fueron mi única respuesta


sábado, 29 de junho de 2013

Sorte

Como um empresário austríaco de 30 anos, de natureza pacífica e simples torna-se em 3 anos o homem mais perigoso da Europa?

Lendo a biografia de Otto Skorzeny percebemos, que mesmo o melhor guerreiro depende de inumeráveis fatores de sorte para se tornar vencedor.

É melhor vencer o inimigo com a fome do que com o ferro, pois na vitória obtida com este vale muito mais a sorte do que o valor.
Maquiável, Arte da Guerra, Livro Sétimo.

Os homens decerto se impressionam demais com as representações da guerra feitas pelas arte, principalmente os cinemas. Quando na verdade deveriam ler biografias de homens como Skorzeny para deslindar o que realmente é a guerra. Skorzeny dizia que a guerra era uma coisa triste, e realmente é.

Face a própria mortalidade nos campos de batalha que nem sempre tem honra. As tribulações e necessidades da trincheira que as vezes são piores que a batalha em si, a depressão, os traumas, a desfiguração psicológica. 

Não obstante, não se pode objetar isso ao dever de se lutar pela pátria e porventura morrer, não se pode desejar a paz a qualquer custo, a custo da sua própria dignidade, e da dignidade de seu povo, isso seria pacifismo.

No fim, a natureza impinge ao homem deveres diversos e inevitáveis, não se deve pensar nessas circunstâncias que atingem todas as pessoas igualmente, como tristes ou felizes, sequer devemos ter opiniões sobre isso, a natureza é indiferente as opiniões dos homens, se há algum sentimento que pode ajudar o homem porém, é a esperança, que se para o universo é irrelevante, para o homem é uma fonte de força e alento, é um dos fundamentos da vontade em si, contrário dos sentimentos de raiva, tristeza e desespero, que somente enfraquecem e nada trazem de bom.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Ryse: Son of Rome


Família

Já falei em meu livro sobre agressão publicado em 1963 e em diversas conferencias(1968/1969), sobre o fato de sabermos qual a proveniência das causas etologicas dessa guerra das gerações. Aqui me limitarei, portanto, ao estritamente necessário. Todos esses fenômenos resultam de uma perturbação funcional, que intervém no organismo quando chega a puberdade. Durante essa fase o adolescente começa a se desligar das tradições familiares. Ele as examina com olhos críticos e procura outras formas de realização de seu ideal, um grupo novo a qual possa se juntar e cuja causa possa abraçar. O desejo instintivo de lutar por uma causa é determinante na escolha de um objetivo, sobretudo nos jovens. Durante esse período, tudo o que é tradicional parece tedioso, tudo que é novo, atraente. Poderíamos até falar de “neofilia fisiológica” ou de um apetite de novidade.

Esse processo tem sem dúvida um grande valor para a manutenção da espécie, razão pela qual foi inscrito no programa de comportamento humano, no decorrer da filogênese. Sua função é a de suavizar a transmissão, excessivamente rígida, das normas culturais do comportamento. Nesse sentido pode ser comparado à muda do caranguejo, que deve rejeitar a carapaça para poder crescer. Toda estrutura sólida destinada a servir de armadura se adquire às custas de uma certa dose de liberdade. A tradição cultural não foge a essa regra. Nela também a parte destrutiva inerente a toda transformação acarreta certos perigos pois, entre o momento da demolição e o da reconstrução, fica-se momentaneamente sem abrigo e sem apoio. É o caso do caranguejo na hora da muda e do adolescente em crise de puberdade.

Normalmente o período de apetência pela novidade ou neofilia é seguido de uma fase de retorno aos valores tradicionais. Isso acontece insensivelmente; a maioria dos homens da minha geração pode testemunhar que, pertos dos sessenta anos, damos muito mais valor às palavras de nossos pais do que dávamos aos dezoito.

Mitscherlich chama esse fenômeno de “obediência tardia”. O apetite pela novidade e a obediência tardia juntas formam um sistema cuja função estabilizadora é a de eliminar os elementos anárquicos da cultura tradicional, que ameaçam deter seu desenvolvimento, mantendo os valores essenciais e insubstituíveis. Como o funcionamento desse sistema depende da interação de numerosos fatores, internos e externos, ele é facilmente alterado.

O atraso do desenvolvimento pode ser determinado pelas condições do meio, mas também por fatores genéticos. Dependendo das causas que o provocam e do momento de seu aparecimento, as conseqüências diferem muito. A persistência no estado de infantilismo pode redundar num excessivo agarramento aos pais e às tradições da geração anterior. Nesse caso as pessoas têm dificuldade em se entender como os de sua idade e acabam frequentemente tornando-se seres extravagantes. Uma fixação anormal no estágio da neofilia provoca um ressentimento característico contra os pais, às vezes mortos há muito, e isso causa uma anomalia do comportamento. Esses dois fenômenos são bem conhecidos dos psicanalistas.

Mas as perturbações que levam ao ódio e à guerra entre gerações têm outras causas, das quais duas principais. Por um lado, cada geração exige modificações e adaptações do patrimônio cultural, cada vez mais importantes. Na época de Abraão o ajustamento às normas de comportamento que o filho recebia do pai, e que por sua vez devia modificar, era tão mínimo que (como Thomas Mann mostrou perfeitamente em seu maravilhoso romance psicológico “José e seus Irmãos”) os homens dificilmente distinguiam sua própria pessoa da do pai, o que constitui a forma de identificação mais perfeita que se possa imaginar. O ritmo de desenvolvimento que a tecnologia impõe à civilização contemporânea é tal que o patrimônio das tradições da atual geração é, com razão, considerado absolutamente ultrapassado pelos jovens. O erro que já mencionamos, de que o homem poderia fazer surgir do solo uma nova cultura de forma racional e arbitrária, leva à aberração de pensar se seria melhor acabar com o mundo dos pais para poder “recriar” um mundo novo. Isso realmente seria possível, desde que se recomeçasse no estágio do homem anterior à Cro-Magnon!

Mas a tendência generalizada dos jovens de hoje, de recusar tudo sem discriminação, tem outras causas. As transformações sofridas pela estrutura familiar a partir da crescente influencia da técnica levam a diminuir progressivamente os contactos entre pais e filhos. Isso já aconteceu em relação ao bebê, não é raro vermos surgir as perturbações que René Spitz qualificou de hospitalismo. Os sintomas decorrentes são uma deficiência grave e frequentemente irreversível da capacidade de manter relações humanas. Essas perturbações vêm reforçar perigosamente as da faculdade de simpatizar com os outros, das quais já falamos no capitulo II.

Mais tarde, a ausência de exemplo paterno cria problemas, sobretudo nos rapazes. A não ser em ambientes de camponeses ou de artesãos, um rapaz hoje em dia quase não vê o pai no trabalho. Ainda mais rara é a oportunidade de ajudá-lo, sentindo assim admiração pelo homem em sua maturidade.

Da mesma forma a família moderna perdeu a estrutura hierárquica que antigamente conferia ao velho sua dignidade respeitável. Uma criança de cinco anos é incapaz de avaliar diretamente a superioridade de seu pai de quarenta anos. Em compensação, é impressionada pela força física de uma criança de dez anos e compreende a admiração que esta devota a seu irmão mais velho de quinze anos. Intuitivamente extrai as conclusões apropriadas, quando vê o irmão mais velho admirar a superioridade intelectual do pai, que ele é bastante inteligente para apreciar.

O reconhecimento de uma situação hierárquica não é um obstáculo ao amor. Cada qual deveria se lembrar de que em criança não amou menos as pessoas que admirava e às quais se submetia. Ao contrario, as amou ainda mais do que aos seus pares e seus inferiores. Ainda me lembro muito bem do respeito que eu tinha por meu amigo Emmanuel la Roche, morto prematuramente, e quatro anos mais velho que eu. Lembro-me também da autoridade, justa mas severa, que ele exercia sobre nosso grupo de crianças de dez a dezesseis anos. E me lembro, enfim, de como eu o amava. Meu sentimento era de qualidade análoga ao afeto que tive mais tarde por alguns amigos mais velhos ou professores que eu venerava. Dizer que a hierarquia natural entre duas pessoas é um obstáculo a sentimentos cordiais, declarar que se trata de uma “frustração” é um dos maiores crimes cometidos pela doutrina pseudodemocrática. Sem essa hierarquia, a forma mais natural do amor humano, a que normalmente une os membros de uma família, nem existiria. Milhares de crianças se tornaram neuróticos infelizes, devido à célebre educação “anti-autoritária” destinada a evitar frustrações.

Como disse em obras já citadas, a criança criada no interior de um grupo não hierarquizado encontra-se numa situação absolutamente artificial. Não podendo reprimir em si a tendência instintiva de ocupar o primeiro lugar, ela tiraniza os pais despidos de resistência, e se vê obrigada a assumir um papel de chefe, no qual não se sente nada bem. Em falta de um superior mais forte que ela, encontra-se sem defesa num mundo que lhe e hostil, pois as crianças criadas de acordo com os métodos “Antiautoritários” não são amadas em lugar nenhum. Quando tenta irritar os pais para provocar uma justa reação de indignação, e “pede tapas” não recebe a resposta agressiva que inconscientemente esperava, mas esbarra no muro de borracha de belos discursos apaziguantes e nas frases ocas pseudo-racionais.

Ora, nenhum homem se identifica com um pobre escravo, ninguém está disposto a deixar que ele lhe dite regras de conduta e ainda menos a admitir os valores culturais que respeita. Somente quando amamos alguém no mais profundo do coração e quando ao mesmo tempo o admiramos podemos adotar essa tradição. Essa “imagem do pai” falta à maioria dos atuais adolescentes. O próprio pai se revela frequentemente incapaz e a superpopulação dos colégios e das universidades impede que um professor respeitado assuma esse papel.

A essas razões de ordem etológica para rejeitar o mundo dos pais, numerosos jovens inteligentes acrescentam razões de ordem ética. Pois a massa domina nossa civilização ocidental contemporânea, com a devastação da natureza, a negação dos verdadeiros valores, a corrida para o dinheiro, o empobrecimento do sentimento, o embrutecimento pela doutrinação. Esses exemplos são evidentemente indignos de serem seguidos, mas levam a esquecer facilmente que todo o fundo de verdade e de sabedoria inerente à nossa cultura. A juventude tem, na verdade, boas razões para entrar em guerra com as diferentes formas de “establishment”. Entretanto, é muito difícil estabelecer quantos desses jovens e desses estudantes revoltados estão maduros para essas considerações. O que acontece, nos embates públicos, é provocado indiscutivelmente por razões bem diferentes, por impulsos que são, inconscientemente, de ordem etológica e entre os quais o ódio étnico(cultural) ocupa o primeiro lugar. Infelizmente, os jovens pensantes que têm motivação racional são também os menos violentos, de forma que a imagem aparente da rebelião é amplamente dominada pelos sintomas de regressão neurótica. Obedecendo a uma lealdade mal compreendida, os mais moderados entre os jovens são manifestamente incapazes de se distanciar dos mais impulsivos. Discutindo com estudantes tive a impressão que a proporção de pessoas razoáveis era muito maior do que as aparências faziam supor.

Não devemos esquecer, apesar de tudo, que as considerações racionais têm um poder de ação bem menor do que a força elementar, instintiva, que se esconde atrás dessas agressões. E sobretudo não devemos esquecer as conseqüências que acarreta para os próprios jovens essa recusa radical das tradições familiares, pois elas podem ser fatais. Durante a fase da “neofilia fisiológica” o adolescente é tomado por um desejo irrefreável de ligar-se a um grupo e, principalmente, participar de suas agressões coletivas. Esse impulso é tão forte quanto o de um outro instinto qualquer programado na filogênese, como sejam a fome ou a sexualidade. Na melhor das hipóteses, esse instinto pode se fixar num objeto determinado através do aprendizado e de argumentações. Mas não pode ser completamente dominado ou eliminado pela razão. Se ele aparecesse dominado, o perigo de uma neurose seria iminente.

No quadro da manutenção de um sistema cultural, o fenômeno normal no estágio ontogênico da puberdade é que os adolescentes se juntem em grupos étnicos*, ao serviço de ideais novos, e que empreendam reformas essenciais das regras do comportamento tradicional, sem entretanto jogar fora, em sua totalidade, o patrimônio cultural de seus pais. Assim, o adolescente se identifica sem equivoco com o grupo jovem de uma cultura antiga. É da natureza profunda do homem – ser de civilização por excelência – encontrar identificação satisfatória somente no interior de uma cultura e através dos intérpretes de uma cultura. Se está impedido pelos obstáculos dos quais falamos, satisfaz sua necessidade de identificação e de pertencer a um grupo, assim como o faria no caso de um impulso sexual insatisfeito, escolhendo um objeto sobressalente. A falta de discernimento, com a qual as forças impulsivas contidas podem se descarregar sobre objetos surpreendentemente mal adaptados, é há muito conhecida de todos os que fazem pesquisas sobre o instinto. Mas existem poucos exemplos tão chocantes quanto os da escolha feita frequentemente pelos jovens em sua apaixonada procura de um grupo. Tudo é melhor do que não pertencer a um grupo, até mesmo ingressar na mais triste das comunidades, a dos drogados. Aristide Esser, especialista neste campo, mostrou que o tédio do qual falamos no capítulo V, e sobretudo a necessidade de fazer parte de um clã levam um número crescente de jovens a se drogar.

*Lorenz usa essa palavra mormente no sentido cultural nesse livro.

Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, Capítulo VII: Ruptura da Tradição, Pg. 93

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Criminosos

Em criminologia, sobretudo, sabemos perfeitamente que as possibilidades de transformar em indivíduos sociais os que sofrem de uma deficiência de vida afetiva são precárias. É o caso dos que nasceram com essa deficiência e dos infelizes que adquiriram devido a educação deficiente ou a uma síndrome de hospitalismo. A ausência da mãe na primeira infância determina uma espécie de incapacidade para estabelecer ligações sociais, quando não provoca perturbações mais graves. Esses se assemelham estranhamente a uma perturbação afetiva inata. Nem todas as taras endógenas são incuráveis, mas é verdade que muitas das perturbações adquiridas são ainda mais difíceis de curar. O velho adágio médico pelo qual mais vale prevenir do que curar, é absolutamente válido para as perturbações psíquicas.

A fé no poderio onipotente das reações condicionadas tem grande parte de responsabilidade em certos estranhos erros judiciários. Em suas  conferências na clínica Menninger de Topoka, Hacker citava o caso de um jovem assassino submetido a um tratamento psicoterapêutico, e em seguida considerado curado e devolvido à liberdade. Cometeu logo outro assassinato, e em seguida mais três. Foi preciso esperar que o criminoso executasse sua quarta vítima para que a sociedade, imbuída de princípios humanitários e behavioristas, admitisse que esse homem representava um perigo público. Comparadas aos estragos causados pela atitude da opinião contemporânea em matéria de crime, essas quatro mortes parecem um mal menor. A convicção, elevada ao nível de religião, de que todos os homens nasceram iguais e que as taras e os defeitos do criminoso são devidos a uma educação frustrada por falta dos educadores, contribui para aniquilar o sentimento normal do bem e do mal, sobretudo no culpado, que se compadece de si mesmo e se considera vítima da sociedade. Recentemente a manchete de um jornal austríaco trazia: “Rapaz de dezesseis anos mata por medo dos pais”. O Rapaz tinha violentado a irmã de dez anos, estrangulando-a em seguida quando ela ameaçara contar tudo aos pais. É possível que, no encadeamento complexo das causas e dos efeitos, os pais tenham tido uma parte da responsabilidade. Em todo caso, não a de inspirar um medo excessivo a seu filho.
 
Essas formas extremas e patológicas que se manifestam na opinião pública, tornam-se compreensíveis quando sabemos que a opinião é uma função de um dos sistemas de regulagem cuja tendência à oscilação já indicamos. A opinião pública é inerte, ela só reage a influências novas depois de longos períodos de insensibilidade. Além do mais é ávida de simplificações grosseiras, brotando geralmente do exagero de uma situação. É por isso que a oposição que se levanta contra uma opinião generalizada tem quase sempre razão. Nesses confrontos, a oposição adota posições arrebatadas que jamais tomaria se não tratasse de compensar o parecer contrário. Se a opinião reinante desaba repentinamente, como costuma acontecer, o pêndulo oscila então em sentido contrário para uma posição igualmente exagerada.

A forma caricatural da democracia liberal contemporânea se situa no ponto culminante da oscilação do pêndulo. No ponto oposto, encontramos Eichmann e Auschwitz, a eutanásia, o ódio racial, o genocídio e o linchamento. É preciso sermos clarividentes e saber que de um lado e de outro se encontram valores autênticos. Que são: o livre desenvolvimento do indivíduo, do lado esquerdo, e um bom equilíbrio sócio cultural do lado direito. Os atos desumanos provêm dos excessos cometidos em uma ou em outra direção. A oscilação está se acentuando, e o perigo já se delineia nos Estados unidos; esperemos que em reação contra a revolta justificada mas descomedida dos jovens e dos negros, não se forneçam a elementos extremistas de direita uma ocasião propícia para pregar, com o mesmo exagero incorrigível, a volta ao outro extremo. Pior ainda: não só o movimento dessas oscilações ideológicas continua sem freio, como elas manifestam uma perigosa tendência a aumentar, com o risco de precipitar e de provocar um desregramento catastrófico. Tentar frear o mais depressa possível esse processo infernal é tarefa dos sábios.
 
Aqui também, e é um dos numerosos impasses em que o mundo civilizado se deixou arrastar, os sentimentos de humanidade que devemos ter para cada um em particular se opõem aos interesses da espécie em geral. A pena que temos dos marginais, cuja inferioridade provém de lesões irreversíveis datando da primeira infância, ou de taras hereditárias, nos impede de proteger os seres normais. Não podemos mais, sequer, empregar as qualificações de superior ou inferior, falando dos homens, sem nos tornarmos suspeitos de pleitear pela câmara de gás.

Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, A Degradação Genética, Pg. 71.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Neofilia

O hábito de excitações cada vez mais forte tende a fazer desaparecer progressivamente a capacidade de sentir prazer. Não é portanto surpreendente que homens blasés procurem excitações sempre novas. Esse amor pela novidade ou “neofilia” afeta praticamente todas as relações de que o homem é capaz com o mundo exterior. Para as pessoas contaminadas por essa doença cultural, um par de sapatos, uma roupa, um carro, perdem o encanto com pouco tempo de uso, exatamente como a pessoa amada, o amigo ou até mesmo a pátria. Posso parecer paradoxal ou cínico, ao afirmar que a pena que alguns de nós sentimos, ao jogar no lixo um velho cachimbo fiel ou um par de calças velhas, tem as mesmas origens que as ligações sociais tecidas entre amigos humanos. Mas quando lembro dos sentimentos com os quais acabei de vender o meu velho carro, ligado a tantas boas lembranças de viagens, devo dizer que eram semelhantes aos de adeus a um amigo. Essa reação surpreende quando ligada a um objeto inanimado, é não só válida como justificada a respeito de um animal evoluído, como um cão. Afastei-me interiormente de numerosas pessoas que me falavam do seu cão e depois acrescentavam: “Mas tivemos que dá-lo de presente quando fomos morar na cidade”.

Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, Uma Tepidez Mortal, Pg. 60.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Instant gratification

O desenvolvimento da tecnologia moderna e especialmente da farmacologia favorecem, em medida até então desconhecida, a aspiração humana de evitar o sofrimento. O conforto moderno é tão usual, que mal nos damos conta de quanto necessitamos. A mais modesta das empregadas ficaria revoltada se lhe oferecêssemos um quarto com aquecimento, a iluminação, a cama e o tipo de conforto que pareciam ótimas a Goethe ou à duquesa Amélia de Weimar. Há poucos anos, quando um incidente catastrófico cortou a eletricidade de Nova Iorque durante algumas horas, muitos pensaram seriamente que o fim do mundo tinha chegado. Mesmo aqueles que acreditavam nas vantagens dos bons tempos e, sobretudo no valor educativo de uma vida espartana, mudariam de opinião se fossem forçados a se submeter ao tratamento cirúrgico usado há dois mil anos. Dominando progressivamente seu meio, o homem moderno, por força das circunstâncias, deslocou o equilíbrio prazer-desagrado no sentido de uma hipersensibilidade crescente a respeito de toda situação dolorosa,
enquanto que sua capacidade de prazer foi se embotando. Por uma série de razões, semelhante situação acarreta conseqüências deletérias.


Uma intolerância crescente para com o desagrado, aliada à redução da atração pelo prazer, leva os homens a perder a capacidade de trabalhar arduamente em busca de um resultado distante embora promissor. Disso, resulta uma exigência impaciente de satisfação de todo desejo embrionário. A necessidade de satisfação imediata (Instant gratification) é infelizmente favorecida de todos os modos pelas empresas comerciais e pelos produtores, sendo espantoso constatar que os consumidores não se dão conta do quanto se tornaram escravos das compras a prazo. Por razões fáceis de entender, a necessidade incoercível de satisfação imediata acarreta conseqüências especialmente desastrosas no âmbito do comportamento sexual. A perda da capacidade de dispor-se a um objetivo a longo prazo causa o desaparecimento das etapas, sutilmente diferenciadas, do comportamento instintivo ou cultural para a conquista do objeto amado. Vemos o desaparecimento não só do programa genético concebido visando à reprodução, mas ainda das normas do comportamento cultural, que buscam o mesmo objetivo no âmbito de uma cultura.

O comportamento resultante, essa satisfação sexual imediata que vemos glorificada por tantos filmes modernos, é freqüente e erroneamente qualificada como satisfação animal. É raríssimo, nos animais superiores, esse tipo de comportamento. Seria melhor dizer “bestial”, se entendermos por bestas aquelas que o homem domesticou, fazendo com que esquecessem as etapas diferenciadas dos ritos e os comportamentos que precedem o acasalamento, a fim de facilitar sua criação.
Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, Uma Tepidez Mortal, Pg. 57.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Do filho do matrimônio

"Tenho uma pergunta para ti só, meu irmão. Arrojo-a como uma sonda à tua alma, a fim de lhe conhecer a profundidade.

És moço e desejas filho e matrimônio. Eu, porém, pergunto. Serás tu homem que tenha o direito de desejar um filho?

Serás tu vitorioso, o vencedor de ti mesmo, o soberano dos sentidos, o dono das tuas virtudes?

É isso o que eu te pergunto.

Ou será que falam do teu desejo a besta e a necessidade física, ou o afastamento, ou a discórdia contigo mesmo?

Eu quero que a tua vitória e a tua liberdade suspirem por um filho. Deves erigir monumento vivente à tua vitória e à tua libertação.

Deves construir qualquer coisa que te seja superior.

Primeiro que tudo, porém, é preciso que te hajas construído a ti mesmo, retangular de corpo e alma.

Não deves só reproduzir-te, mas exceder-te! Sirva-te para isso o jardim do matrimônio!

Deves criar um corpo superior, um primeiro movimento, uma roda que gire sobre si; deves criar um criador.

Matrimônio: chamo assim à vontade de dois criarem um que seja mais do que aqueles que o criaram. O matrimônio é o respeito recíproco: respeito recíproco dos que coincidem em tal vontade.

Seja este o sentido e a verdade do teu matrimônio; mas isso a que os que estão demais, os supérfluos, chamam matrimônio, isso como se há de chamar?

Ai! Que pobreza de alma entre dois! Que imundície de alma entre dois! Que mísera conformidade entre dois!

A tudo isso chamam matrimônio, e dizem que contraem estas uniões no céu!

Pois bem! Eu não quero esse céu dos supérfluos. Não; eu não quero essas bestas presas com redes divinas!

Fique-se também por lá bem longe de mim esse Deus que vem coxeando abençoar aquilo que não uniu!

Não vos riais de semelhantes matrimônios!

Que filho não teria razão para chorar por causa de seus pais?

Certo homem pareceu-me digno e sensato para o sentido da terra, mas quando vi a mulher dele, a terra pareceu-me moradia de insensatos.

Sim; queria que a terra se convulsionasse quando se acasalam um santo e uma pata.

Tal outro partiu como herói em busca de verdades e não trouxe por colheita senão uma mentira engalanada. Chamam a isso o seu matrimônio.

Este era frio nas suas relações e escolhia ponderadamente; mas de uma só vez transtornou para sempre a sua sociedade. A isso chamam o seu matrimônio.

Aquele procurava uma servente com as virtudes de um anjo; mas daí a pouco tornou-se servente de uma mulher, e agora precisava ele tornar-se anjo.

Vejo agora todos os compradores muito senhores de si e com olhos astutos; mas até o mais astuto compra a sua mulher às cegas.

A muitas loucuras pequenas chamais amor. E o vosso matrimônio termina muitas loucuras pequenas para as tornar uma loucura grande.

O vosso amor à mulher e o amor da mulher pelo homem, ó! seja compaixão para deuses dolentes e ocultos! Duas bestas, porém, quase sempre se adivinham.

O vosso melhor amor, contudo, ainda não é mais do que uma imagem extasiada e um ardor doloroso. É um facho que vos deve iluminar para caminhos superiores.

Um dia deverá o vosso amor elevar-se acima de vós mesmos! Aprendei, pois, primeiro a amar! Por isso vos foi preciso beber o amargo cálice do vosso amor.

Existe amargura no cálice do melhor amor; assim vos faz desejar o Super-homem; assim tendes sede do criador.

Sede do criador, seta e desejo do Super-homem; diz-me, meu irmão, é essa a tua vontade do matrimônio?

Santa é para mim tal vontade, santo tal matrimônio"

Assim falava Zaratustra.

NIETZSCHE, Assim falou Zaratustra, Primeira Parte, Do filho do matrimônio.

domingo, 19 de maio de 2013

Superpopulação

Na realidade, o ajuntamento humano nas cidades modernas é em grande parte responsável por não sermos mais capazes de distinguir o rosto do próximo nessa fantasmagoria de imagens humanas que mudam, se superpõem e se apagam continuamente. Diante dessa multidão e dessa promiscuidade nosso amor pelos outros se desgasta a tal ponto que o perdemos de vista. Os que querem ainda ter para com seus semelhantes sentimentos benévolos, são obrigados a se concentrar em um pequeno número de amigos. Pois somos feitos de modo que nos é impossível amar toda a humanidade, apesar da justeza dessa exigência moral. Somos portanto obrigados a fazer uma escolha, ou seja, a manter a distância, emocionalmente, numerosos seres dignos da nossa amizade. "Not to get emotionally involved" é um dos principais cuidados de muitos habitantes das grandes cidades. É um processo absolutamente inevitável para cada um de nós, mas já manchado de desumanidade. Lembra a atitude dos antigos plantadores americanos que tratavam com muita humanidade os negros encarregados do serviço da casa, enquanto consideravam os escravos das plantações como animais domésticos de algum valor. Levando mais adiante esse tipo de defesa voluntária contra as relações humanas, veremos que, de conformidade com os fenômenos de exaustão do sentimento, dos quais falaremos mais adiante, ele conduz às espantosas manifestações de indiferença que os jornais relatam diariamente. Quanto mais somos levados a viver na promiscuidade das massas, mas cada um de nós se sente acuado pela necessidade de "not to get involved". É assim que hoje em dia os ataques a mão armada, o assassinato e o estupro podem acontecer em plena luz do dia, justamente no centro das grnade cidades, nas ruas cheias de gente, sem que sequer um transeunte intervenha.

Amontoar os homens em espaços limitados leva de forma indireta a atos de desumanidade provocados pelo esgotamento e desaparecimento progressivo dos contatos, e é a causa direta de todo um comportamento agressivo. Numerosas experiências realizadas em animais nos ensinaram que a agressividade entre congêneres pode ser estimulada amontoando-os em espaço limitado. Quem nunca teve experiência semelhante, quer em cativeiro, quer numa situação semelhante,  em que muitas pessoas vivem juntas por força das circunstâncias, não pode avaliar o grau de intensidade que chega a irritabilidade. E se a pessoa tenta se controlar, se se esmera no contato de cada dia, de cada hora, para ter uma atitude delicada, e portanto amigável, para companheiros pelos quais não tem qualquer amizade, a situação se torna um suplício. A falta de amabilidade generalizada, que podemos observar em todas as grandes cidades, é claramente proporcional à densidade das massas humanas aglomeradas em determinado lugar. Atinge proporções aterradoras nas grandes estações, ou nos terminais de Nova York, por exemplo.

A superpopulação contribui diretamente para gerar todos os problemas, todos os fenômenos de decadência que estudaremos nos sete capítulos seguintes. Acreditar na possibilidade de se produzir, graças a um "condicionamento" apropriado, um novo tipo de homem, armado contra as consequências nefandas do empilhamento num espaço limitado, me parece uma ilusão perigosa.

Konrad Lorenz, Civilização e Pecado, Superpopulação, 1974

domingo, 21 de abril de 2013

Tradição




Gebrannt im Feuer der Äonen
Queimado no fogo das eras
Empfangen tief im Schoß der Zeit
Concebido no seio das eras
Um über aller Welt zu thronen
Soberano sobre o mundo inteiro
Entschlossen und zum Kampf bereit
Resoluto e pronto para a guerra

Im Blut und Schweiße unserer Ahnen
Em sangue e suor nossa ancestralidade
Empfangen wir das Sakrament
Recebemos nós o sacramento
Getauft mit ihrem heil’gen Namen
Batizados com seu nome sagrado
Im Schein der Flamme die in uns brennt

No lume da flama que queima em nós

Wer trägt das Feuer?
Quem carrega o fogo?
Wenn nur noch Asche diese Welt bedeckt
Quando apenas cinzas cobrem esse mundo
Wer trägt das Feuer?

Quem carrega o fogo?
Das den Gott in uns erweckt
Que Deus despertou em nós

Es ist jedes Kind des Landes

É cada criança do país
Jede Tochter, jeder Sohn
Cada filha, cada filho

Jedes Ursprungs, jedes Standes
Cada raiz, cada objeto

Einer stolzen Nation
Uma nação orgulhosa


Ihr tragt das Erbe vieler Leben

Eles trazem o legado vivo
Die Freiheit vielen Blutes Zoll
O dever da liberdade em seu sangue
Das durch euer stetes Streben
Que através da constante luta
In neuem Glanze scheinen soll
Refulgirá em novos esplendores

Wer trägt das Feuer?
Quem carrega o fogo?
Wenn nur noch Asche diese Welt bedeckt
Quando apenas cinzas cobrem esse mundo
Wer trägt das Feuer?
Quem carrega o fogo?
Das den Gott in uns erweckt
Que Deus despertou em nós

Wer trägt das Feuer?
Quem carrega o fogo?
Und heiligt es mit neuem Ruhm
E santifica-o com novas glórias
Wer trägt das Feuer?
Quem carrega o fogo?
Auf ewig fort in seinem Tun
Pela eternidade em seus atos

''Tradition ist nicht das Anbeten der Asche, sondern die Weitergabe des Feuers.''


"A tradição não é o culto das cinzas, mas a preservação da flama." ~ Gustav Mahler