quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Sonho

Ah, estamos quase na primavera! Inverno, sois demasiado prolixo, tomais demasiado tempo à minha sensibilidade, ao meu espírito exclusivo, Primavera, gostaria de falar-lhe ao ouvido.
Lançar ao teu entendimento as doces palavras suaves, nos laivos de poesia que escorrem de meus olhos, sob tua leve brisa, um beijo de gratidão à natureza, tanto ao céu azul, como ao oceano arquipotente.
Poderia eu supor que me amas deveras? Primavera, seus leves fluxos me renovam, sinto a vida na morte, e minh'alma a evolar nas cumeadas superiores, e subitamente descair em terríveis prazeres, e tudo está em harmonia e tudo está feliz.
Ah, vede! A Primavera chega, essa nobre donzela, traz com ela seus benévolos eflúvios, mas ontem eu estava perturbado e recolhi-me ao leito mais cedo que o de costume, tive um belo sonho, tive um sonho inesquecível, ah, hoje eu despertei com a alma repleta de delicadeza, estive volando pelos átrios de meu solar por todo o dia, homiziado, tal qual benigno aventesma, a divagar... Já que o sonho foi incrível cabe a mim relatá-lo.
...Via-me eu num bosque escuro e sombrio, perante uma fonte de mármore branco, a água refratava em seu brilho cristalino o fulgor argênteo de uma lua plácida e soberana, noctívaga como eu, o ar era úmido e frio, ao meu redor apenas a penumbra de uma mata densa de abetos, carvalhos e oliveiras, o que eu conseguia ouvir era o murmurar da água, e eis que eu vejo uma cadeira de ouro com um suntuoso estofado de seda e um florete ao seu lado, também com áurea bainha, eu, vagarosamente sentei-me naquela cadeira, iluminada apenas pelo luar, suavemente fui desembainhando aquele florete ornamentado, respirando o fresco ar da madrugada, e me pus calmo e absorto a contemplar a escuridão, imerso na gravidade de uma solitude aristocrática, tal qual um rei, após alguns instantes, dois pontos a brilhar na obscuridade, e das arvores se descobria uma mulher, uma invulgar presença, que me desconcertava completamente! Ela era dotada de uma rara beleza, à medida que ela se aproximava de mim eu distinguia seus suaves traços sob o clarão do luar, sua sedosa e esvoaçante cabeleira, os olhos, da cor e com o brilho de safiras, ao deslindar tamanha beldade, encontrei-me em uma letargia extática, um milhão de explosões sensoriais grassavam pelo meu corpo, enquanto ela vinha em minha direção, ela me despertou um intenso desejo, inexplicável em palavras, sentia inflamar-se em mim um anseio desesperado por seus beijos, ela parou a minha frente, por um instante eu deslizei meus olhos enleados sobre ela dos pés a cabeça, ah, que visão celestial, privilégio indescritível, eu vibrava de tensão numa deliciosa expectativa, ela curvou-se sobre mim até eu sentir sua ofegante respiração sobre meu rosto, seu hálito era melífluo e balsâmico, como dos lírios e jasmins em flor, ela me olhava fixamente, seu olhar era lânguido porém envolvido de certa lascívia, ela se levanta e começa se despir , céus, eu nunca vira até ontem, curvas tão perfeitas, a pele branquíssima como a neve, consubstanciando em si toda a delicadeza e suavidade nos traços própria das Deusas do Olimpo, eis a mulher de meus sonhos, minha musa! Ela tomou minha mão, levantei-me, ela enlaçou meu pescoço, ainda com aquele olhar, aqueles grandes olhos verdes, me entorpeciam, os lábios rubros se oferecendo a mim, colhi um beijo então, naquela linda face, senti sua língua quente e macia na minha, depois ela parou seus olhos nos meus, e após, sussurrou em meu ouvido com voz cristalina:
- Guarda-me com teu sangue, pois sou tua honra, ama-me com teu coração, pois eu vos completo.
Logo depois ela me entregou o florete com a roda do sol cravada na manopla , então tudo se desvaneceu...

Tenaglia

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