sábado, 5 de dezembro de 2020

2020

Um ano cheio de percalços, tribulações e desditas, mas ao contrário de outros, não serei leviano ao atribuir tais calamidades ao fado. Não, fora eu meu próprio guia para a escuridão, eu o artífice de meu decaimento, descendo ao tétrico sorvedouro onde minha alma sofre em agonia, por perder-se, esquecer-se de si e corromper-se miseravelmente, escrava dos sentidos e de minha mente irracional ávida por prazeres obliterando-se.

Houveram oportunidades para reflexões sobre nossa condição humana e a aquisição de alguma sabedoria.

E para não dizer que foi um ano ignominioso por completo, houve sim uma ascensão, que foi quebrada e então deu inicio a precipitação.

Comecemos pela precipitação e consequentes desvegonhas.

É preciso confessar, não venci os vícios da gula e da luxúria, ou talvez os tenha vencido mas foi temporariamente.

Luxúria, azorrague esbraseante que aflige o coração dos homens, escurece a alma, deturpa num significado vil o mais sacro ato de amor entre homem e mulher, o próprio ato da concepção, criação de vida, corrompido num mero ato estéril de concupiscência e egoísmo, defraudando qualquer nobreza imbuída aí pela natureza. Que esse vício seja desarraigado de meu ser, pois para mim é sevícia tenebrosa viver nessa Babilônia, e que dor mais pungente participar disso, cego pelo frenesi de meu sangue abrasador. Meu coração contrito sofre profundamente.

Rogo a Deus por uma boa esposa, a quem possa amar e constituir família.

A gula, signo patente do homem remisso, amador de prazeres, um dos vícios mais deletérios, destrói a saúde e a alma. Oferece-nos, não obstante, um exemplo diserto, de como o pecado é, se por um lado as comidas naturais com seu sabor sóbrio alimenta e constrói nossos músculos e ossos, por outro, as comidas artificiais, insalubres, oferecem aos cachões sensações várias, deleitosas, mas que nos enfraquecem, depletam nossa saúde, encurtam nossos anos, mais ainda, cobrem de fealdade o templo de nossa alma, o nosso corpo. Tudo em troca de sensações fugazes, uma fuga da realidade através do prazer dos sabores.

Prefira o alimento que contenha a vida ao invés de tua destruição, a sobriedade é preferível a intensidade.

Assim eu confesso, Deus há de alçar-me de toda essa iniquidade, Ele conhece os recônditos de meu coração. Está comigo, não me abandonará.

Esse ano outrossim adquiri alguma sabedoria como consequência de eventos fatídicos. Nomeadamente, perdi um ente querido.

Fez-me pensar em como erramos pelas eiras da mortalidade, preocupando-nos apenas conosco, negligenciando nosso deveres afetivos, ignorando quem nos causa fastio, exigindo perfeição, nós imperfeitos. Como as pessoas estão cada vez mais frias, como se importam pouco com os outros.

Como o cálido sentimento de amizade é dos mais valiosos e puros, símbolo da virilidade castiça. Quem tem amigos tem tudo que precisa, quem tem uma comunidade, tem raízes, e não é derrubado tão fácil pelos demônios modernos.

Hoje somos escalpelados, se demonstramos nossa humanidade, temos de viver segundo os padrões ditados pela mídia, pseudovalores, dissoluções, sinalização de virtudes e corrupção da alma, a sociedade atual não quer que tu pertenças a grupo algum, senão aqueles aprovados pelo sistema, os politicamente corretos, se não pertencer a esses, eles querem que tu sejas somente um "indivíduo" sem face, sem história, um bom consumidor.

Voltando a meu aprendizado de humanidade, eu creio que perdi um pouco a recalcitrância em demonstrar sentimentos benévolos, a apreciar as pessoas e suas qualidades, a aplaudir, a elogiar sem a pestífera solércia de alguém que busca algo em troca ou tem outro fim ulterior.

Minha alma tornou-se mais afável e agradeço a Deus por ver o erro de meus caminhos de antanho, nesse sentido, tornei-me mais humano.

Diante de tal elocução, devo também reconhecer que nem tudo foram trevas, busquei alteroso os ares excelsos e quase consegui. Antes da fraudemia fechar as academias, tinha vencido a gula e graças aos treinos corporais atingia a melhor forma física de minha vida. Atingia a disciplina também para estudar a sério um livro que há muito desejava. Tudo isso durou até junho. Daí em diante despenhei-me numa voragem descendente que conduziu-me ao oblívio que estou hoje, mas tenho saúde, tenho sabedoria, sei o que devo fazer, a virtude é tangível para mim, e para ti também nobre leitor que dignou-se a ler este humilde texto até aqui, Deus está contigo e te dará forças e virtudes para materializar a visão de tua alma nesse plano material, acreditemos na vitória e confiemos.

Salve Deus!

Nenhum comentário:

Postar um comentário